quarta-feira, 5 de março de 2014

* Ariano reinou no Galo

Não creio que o Recife, berço de tantas personalidades literárias e culturais, ao longo de sua história de louvações e merecimentos a seus filhos ilustres ou a outros também notáveis, não nascidos aqui, como é o caso do dramaturgo e escritor Ariano Suassuna, tenha aberto o seu coração com tamanha intensidade de simpatia e acolhimento como a esse grande homenageado do Galo da Madrugada, no sábado de Carnaval. Esse foi o sábado talvez mais memorável na vida de Ariano, depois das glórias literárias conquistadas por ele, não tendo sido diferente para os mais de um milhão e meio de foliões que assistiram, como eu, ao desfile carnavalesco em sua homenagem, à reconstrução artística da sua obra literária e seus personagens mundialmente conhecidos e famosos, por meio de carros alegóricos que deveriam ser preservados após o Carnaval. Assim como deveriam ser guardados para mostra permanente outros trabalhos de alegoria carnavalesca em sua homenagem, feitos anteriormente no Recife e por escolas de samba famosas do Rio de Janeiro. 
Tenho para mim que um bom espaço para preservar esse acervo artístico valioso seria por certo a Fundação de Cultura Pedra do Reino, um castelo de verdade construído na cidade pernambucana de São José Belmonte por um jovem empresário, totalmente dedicado à vida e à obra literária de Ariano, que deveria ser conhecido e mais divulgado, tamanho o esforço do seu idealizador. Assim como o interesse da instituição em guardar parte da biblioteca pessoal de Ariano, os livros da vida de Ariano. 
Temo muito em falar de mitos, a começar pelos mitos gregos, tema do meu interesse intelectual mais recente, desde quando voltei da Grécia, em 2012. Os elementos simbólicos e sobrenaturais para explicar a realidade, o mundo, a existência. Não se faz mitos, nenhum deles foi feito, nasceram mito, cresceram sob o olhar dos deuses e se ampliaram mito, em audiência com a eternidade, que inspira confiança e fidelidade. Desconfio das unanimidades: Gilberto Freyre, Guimarães Rosa, José Lins do Rego, entre tantas celebridades brasileiras, não foram unanimidades, infelizmente, por determinada crítica desinformada, caolha, comprometida, unilateral. Nada perderam esses nomes, se eternizaram. Raros, no entanto, tiveram o aplauso caloroso das multidões. O delírio da multidão. Ariano Suassuna e sua capacidade de júbilo, é um deles. 
Nesse sábado de Carnaval, para mim tão feliz, inesquecível e alegre, houve momento de incerteza para meus ouvidos: O delírio todo dos foliões que ouvi de perto era para o Galo ou por esse eterno jovem, imaginoso, criativo, resistente, desafiador, alegre e brincalhão Ariano Suassuna, o talvez mais amado escritor brasileiro dos nossos dias? O autor que reúne a superlativa unanimidade da crítica. A mesma exaltação ao Galo era repetida em louvor a Ariano. Se tivesse saído do camarote, seria carregado nos braços como deus primordial do maior bloco de carnaval do mundo. Compreendi mais uma vez, nesse dia, que o livro vai sobreviver, por causa dele a multidão tomou conta de minha cidade num belo dia de Carnaval. Seja qual for a forma do livro, ele vai sobreviver.
Ariano é singular.O seu reino de criação e imaginação se eternizará. Evoé, Ariano!


Antônio Campos
Advogado, Escritor, Membro da Academia Pernambucana de Letras e Curador da Fliporto.
camposad@campos advogados.com.br

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