terça-feira, 9 de junho de 2009

* Heranças de Rebeldia Quilombola



Quero gritar no meio da Mata,
Quero cantar no meio da praça!
Quero dizer sempre na hora exata
O que meu coração sente forte,
Até chegar o exalar da morte
Que num poeta não é concreto,
Pois a imortalidade em poesia
Faz-me eterno por divina magia.


Com o meu mais ferrenho desejo em verso,
Imprimo, na cega sociedade, minha nobre rebeldia
Herdada de guerreiros quilombolas
Desta terra de índios e negros rebelados;
Poucos citados nas fontes escassas da historiografia.
Sou artista, preciso marcar época e contar.
O que a tradição me repassa, versifico.
Através da Arte, o brado do meu povo é eterno.


Mas meu verso é justo e aqui concretizo
Os porquês de ser por meu povo bem quisto:
Canto embolada, xote, baião coco de roda, Aboio, loas de maracatu e reisado.
Faço se possível a maior presepada,
Mas não deixo minhas raízes culturais,
Nem quero nossa História desprezada,
Nem canto modas colonizadoras banais.

Defendo minha terra palmarina com afinco.
Escute com atenção porque eu não minto:
Sou filho da região onde a cana tombou palmeirais
Que inspiraram os negros rebeldes que unidos aos índios,
Lutaram contra os desmandos colonizadores senhoriais.
Assim foi o Quilombo dos Palmares por quase um Século,
Lugar de igualdade e fraternidade, resistência aos ímpios,
República de rebeldes em meio à Colônia de Monarquias.



Os canhões de Domingos Jorge Velho, derrubaram cercas,
Destruíram muros e vidas dos valorosos quilombolas amotinados.
Um grande crime aos Direitos Humanos, incalculáveis perdas
Num genocídio sem igual contra índios, negros e brancos rebelados.
Mas não conseguiram destruir os herdeiros dos negros enfezados,
Nem calar um ideal de liberdade expresso em canções e danças
Das nossas expressões populares, mantenedoras das esperanças
Do nosso povo brincante, na cultura mais diversificada do mundo.


O território conquistado pelos palmarinos,
Desde o Cabo de Santo Agostinho até o Rio São Francisco
Uma República com senso organizacional nunca antes visto.
Após aquele grande genocídio, as terras foram divididas.
Entre os soldados, burgueses e fidalgos, foram distribuídas.
E minha Cidade, sofreu impasses de comandos de coronéis e barões,
Teve nomes diversos, escolhidos pelos gostos de donos dos brasões,
Ao som dos badalos dos beatíficos sinos.


A Família dos Montes adquiriu a sesmaria
e nomeou o lugar com empáfia: Povoado dos Montes,
num jogo de cintura clerical para não milindrar.
E até para o culto da Santa Virgem Maria
Teve que ser a Nossa Senhora da Conceição dos Montes,
Não pelos montes que circundam o lugar, Mas pela família que ganhou a posse das terras,
Embora a Santa foi cultuada pelos quilombolas.


Há um incidente durante a Revolução Praieira,
Alguns casos engraçados sem eira nem beira,
Da passagem de Pedro Ivo e soldados atolados,
Num lamaçal, onde um corneteiro perdeu uma trombeta.
E o povo rebelde para se ver livre do nome da Família herdeira,
Aproveitou-se do fato e renomeou o povoado de Trombetas.
E sob a inspiração do rio poético, veio o Povoado do Una,
Em pleno surgimento do Clube Literário de marca profunda.

Tem a fase do implante do Escritório da Great Western,
Pelos idos de oitocentos e sessenta e dois, do for all
Entendido por forró pelos matutos cabras da peste.
Aqui ficou implantada a Estação Ferroviária do Una
Que prenunciava um movimento de revolta geral,
Instigada pelos poetas organizados, rebelados, em suma,
Chegando a conseguir o Distrito em oitocentos e sessenta e oito,
Mas os moradores do Vale do Una tinha algo muito mais afoito.

Lideranças queriam mais, e em oitocentos e setente e três,

sendo quinze anos antes da Abolição da Escravatura,

o nome proibido dos Palmares foi defendido mais uma vez

e foi criado o Município Autônomo dos Palmares.
Eis que a História é reconquistada com grande ventura.
Mas somente após seis anos de lutas dos escritores,
Aos nove de junho, em oitocentos e setente e nove,
Palmares foi Município emancipado, com foros de Cidade.



Em minhas veias circulam heranças de Cultura e Grandeza,
E como cantador e poeta, mato a cobra e mostro o pau,
Me arreto, dou cambalhotas, gingo capoeira e viro a mesa
Mas não arredo o pé do meu lugar, eu luto por minha terra
Como os poetas lutaram pelo nome da Cidade ser honrado
Novamente com o nome batizado pelo africano amotinado
e hoje ser conhecida como a tradicional Terra dos Poetas.
Palmares, eu te amo pelo valor cultural e lutas que encerras.


Palmares, 11 de agosto de 2005.
© Jaorish Gomes Teles da Silva



Do livro QUIXOTESCÂNTICO
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Comemorando o 130º Aniversário de Emancipação Política do Município dos Palmares - PE.
Bandeira Municipal dos Palmares
Escudo de Armas do Município dos Palmares (autor: Telles Júnior)
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Um comentário:

  1. muito bem escrito,bom saber que longe do sudeste, Minas pois sou mineira, as coisas acontecem e não são divulgadas, nacionalmente, tudo se centra por aqui.Foi um prazer aprender a história tão bem contado por esse poeta.

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