domingo, 7 de julho de 2013

* John Banville é aplaudido ao defender separação entre arte e política

O escritor irlandês participou de palestra da 11ª Flip com a contista norte-americana Lydia Davis

Aline Viana
John Banville
O irlandês John Banville e a norte-americana Lydia Davis foram os protagonistas da conferência intitulada “Os limites da prosa”, que aconteceu no sábado (6) na 11ª edição da Festa Literária de Paraty. Banville é cotado para ganhar o prêmio Nobel de Literatura e Lydia é uma aclamada contista e tradutora de autores franceses como Marcel Proust. Embora o auditório estivesse repleto e a palestra tenha tido vários pontos altos, a única ovação do público ocorreu quando Banville foi categórico ao defender a separação entre arte e política.
“Quem escreve prosa está procurando sempre uma maneira convincente de contar, não a realidade, mas a sua versão da realidade. Prosa não tem regra. Quando pediram a (James) Joyce que explicasse (seu romance) ‘Ulisses’ em uma frase, ele perguntou: ‘Frase de que tamanho?’. Porém, às vezes, a frase fica tão rebuscada que ela não significa nada e se torna estilo puro”, analisou o irlandês sobre a pergunta tema da mesa.
Para o escritor, o limite da prosa se estabelece na escolha do tipo de narrador, se onisciente ou personagem: “Eu nunca gostei de escrever em terceira pessoa. A narrativa em primeira pessoa sempre me parece mais infantil, mas eu gosto de ser infantil. Sou só eu olhando para o mundo. A narrativa em primeira pessoa também tem seus limites, mas para mim ela inclui mais do que a narrativa em terceira pessoa”.
Aline Viana
Lydia Davis
O mediador da palestra pediu que Lydia comentasse a influência do escritor irlandês Samuel Beckett. A norte-americana contou que o primeiro livro que leu do autor foi “A morte de Malone”, que começa com a narrativa de um episódio cotidiano: “O começo do livro tem um enredo sobre um velhinho muito frágil, que estava na cama, e tinha perdido um lápis e algumas páginas depois ele o reencontra. Foi uma revelação para mim, depois de Jane Eyre, de (Emily) Bronte. Foi uma coisa fascinante ler sobre uma pessoa que perde um lápis e depois o encontra. Beckett tem uma linguagem simples e por trás um pensamento muito complexo”.
Sobre seu processo de escrita, Lydia contou que anota coisas que a marcam ao longo do dia e depois as retrabalha até que o conto ganhe forma. “É como se os contos estivessem nessas notinhas esperando. Aos poucos, o conto vai se sugerindo para mim”, definiu a autora. A escritora ainda revelou que ao escrever assume o ponto de vista do personagem: “Eu me identifico (com o personagem) e tento ver pelos olhos dele. Pode ser uma mosca ou uma pessoa. Por isso eu também traduzo, porque eu consigo me ver na mente do escritor”.
Enquanto Banville explicou-se com uma metáfora: “Quando eu era jovem, eu conseguia controlar tudo. Sabia a última frase antes de escrever a primeira. Agora, tudo para mim é uma grande confusão. A idade confunde. Quando me perguntam em entrevistas de onde vêm as minhas ideias, eu pergunto (ao interlocutor): de onde vêm os sonhos? Eu não sei. E prefiro viver nesse estado de sonho controlado”.
Sobre os livros policiais que escreve sob o pseudônimo de Benjamin Black, disse Banville: “Escrevo essas histórias porque é o que dá dinheiro. Meus filhos estão naquele ninho como passarinhos e tenho que ter dinheiro. Eu não amo esses livros, mas eu gosto”.
Quanto à questão sobre uma possível intersecção entre arte e política, o irlandês ganhou aplausos do público ao afirmar: “Não misturo arte com política, tem que escolher uma ou outra. Não é possível fazer declarações políticas através da arte e nem o contrário. A única obrigação da arte é ser arte”. A norte-americana discordou: “As convicções políticas acabam aparecendo no trabalho de uma forma muito natural, (porque) tudo o que você é acaba surgindo no trabalho”.


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