domingo, 28 de julho de 2013

* Os vários papéis dos pseudônimos na literatura

Revelação que J. K. Rowling escreveu livro com outro nome lembra uma longa tradição literária de alcunhas de escritores e poetas

J. K. Rowling assumiu recentemente que escrever com pseudônimo foi uma

J. K. Rowling assumiu recentemente que escrever com pseudônimo foi uma "experiência libertadora"

Divulgação

Ser alguém pode ser uma prisão: de certa forma, um nome sempre carrega o peso de uma história, de uma fama e de alguns hábitos. Na literatura, escapar de si mesmo é um expediente comum; na verdade, um dos motores da ficção e dos versos é a permissão para inventar para si mesmo um papel, uma linguagem e uma olhar diferente a partir de um narrador, por exemplo. Quando isso não é suficiente, no entanto, sempre existem outras formas, tão radicais quanto comuns: os pseudônimos.
Um caso recente surpreendeu o mundo. Na semana passada, a best-seller inglesa J. K. Rowling admitiu que havia publicado um romance policial usando o nome Robert Galbraith por uma pequena editora inglesa – algo que não é incomum entre autores famosos da literatura. A obra havia ganhado resenhas elogiosas, mas não tinha ido além de 1,5 mil cópias vendidas. Agora já é a mais vendida da semana em várias livrarias estrangeiras – sinal de que até no mundo do mercado literário saber escrever dentro de um gênero não é suficiente: a fama sempre é importante.
Na nota em que admitiu a manobra, J.K. Rowling comentou que a experiência havia sido “absolutamente libertadora”. De certa forma a invenção de uma outra persona literária para si mesmo sempre nasce sob o signo da liberdade: contra a repressão política ou estética, contra uma expectativa de leitores, contra o próprio estilo.
“Para alguns autores, o pseudônimo serve para não se expor. Para outros, é uma forma de nascer novamente, um requinte ligado a uma nova biografia que foge do cotidiano”, explica a professora de Letras da UFPE e poeta Lucila Nogueira. No livro Pseudonímia e literatura: Cravan/Pessoa/Drummond, ela analisa o uso da criação de outro nome como parte da obra desses autores. “Um pseudônimo pode ser uma forma de ocultação e, ao mesmo tempo, de revelação de uma de vida”, aponta.
Ainda que hoje Lucila acredite que mundo literário é mais aberto, o que exige menos pseudônimos, ela não vê que o recurso deve parar de ser utilizado em breve. Uma prova disso é a existência de autores contemporâneos, para além de J. K. Rowling, que se usam de alcunhas para parte da sua obra.
A questão é que o tipo de liberdade buscado não é em relação a uma repressão política ou estética. “Um novo nome literário fornece a qualquer autor uma boa oportunidade pra que este se reinvente, reinventado seu mundo”, conta o escritor paulista Luiz Bras, nome que Nelson de Oliveira começou a assumir há mais de dez anos. Mais do que uma duplicação, o pseudônimo se tornou sua única voz atual. Em 2012, ele avisou que não mais escreveria como Nelson, dono de uma vasta obra ficcional e acadêmica.
A mudança, para Luiz, foi completamente benéfica. “Se bem administrado, um novo nome literário pode salvar um autor. Foi o que aconteceu comigo. Fui salvo da repetição e da mesmice”.
Um outro caso da produtividade de uma outra identidade é o poeta pernambucano Raimundo de Moraes. Seu primeiro heterônimo – ele vê uma diferença fundamental entre o termo e o conceito de pseudônimo – foi Aymmar Rodriguéz, que apareceu na década de 1980. O personagem não apareceu por escolha sua, mas por uma necessidade que foge à sua compreensão. “Eu nunca planejei nada. Aymmar surgiu de repente e eu jamais poderia assinar a produção dele como Raimundo”, conta o autor. “A minha poesia como Raimundo e como Aymmar é tão diferente que é até contraditória”.

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